O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, anunciou, na última segunda-feira (21), seu plano de suspensão das restrições contra a covid-19, que ficou conhecido como “Living With Covid”. As medidas, no entanto, ainda precisam ser aprovadas pelo Parlamento, e atraíram o ceticismo de alguns cientistas e oponentes políticos.

O premiê britânico propôs, em discurso na Câmara dos Comuns, que todos os regulamentos relacionados à prevenção dos contágios pelo novo coronavírus, incluindo aqueles que determinam o lockdown e exigem que as pessoas se autoisolem caso testem positivo, sejam descontinuados a partir desta quinta-feira (24).

Confira, abaixo, as principais mudanças que devem ocorrer nos próximos dias.


Prédio do parlamento britânico (Marcin Nowak/Unsplash)

Testes para viagens permanecem

Os testes de viagem e a burocracia relativa às chegadas nos aeroportos britânicos vão continuar, apesar do relaxamento das restrições domésticas. Os viajantes não vacinados ainda serão obrigados a fazer um teste antes da partida e pagar por um teste PCR  antes de sua chegada ou até seu segundo dia em solo britânico.

Todos os viajantes — vacinados ou não — também terão que continuar a preencher o “passenger locator form” para entrar no Reino Unido. Esta determinação foi vista com maus olhos pela indústria turística britânica e parlamentares conservadores que fizeram campanha por viagens “sem atrito”.

Grant Shapps, secretário de Transportes do país, deve anunciar planos de longo prazo para viagens no próximo mês. Os planos podem implicar na simplificação do formulário, na eliminação da quarentena em hotéis para viajantes vindos de países da lista vermelha e na implantação de medidas para evitar o retorno ao fechamento de fronteiras.

Shapps tem trabalhado com outros países para elaborar um “manual” de regras para lidar com novas cepas da covid-19, para que ações possam ser tomadas sem fechar fronteiras. Segundo ele, isso “ajudará a garantir que, em vez de fechar, possamos implementar medidas que sejam acordadas internacionalmente, se necessário”.

Fim da obrigação do autoisolamento

Quem testar positivo e seus contatos próximos não serão mais obrigados por lei a se autoisolarem. Qualquer pessoa que receber um resultado positivo após 24 de fevereiro será aconselhada a se isolar por cinco dias e evitar o contato com pessoas vulneráveis, mas não será obrigada a fazê-lo.

O mesmo vale para as pessoas não vacinadas e que tiveram contato próximo com um caso positivo. O dever legal dos trabalhadores de informar aos empregadores se eles precisam se autoisolar também acabará, assim como o apoio financeiro do governo às pessoas que estão em isolamento.

O primeiro-ministro disse que não “esperaria pelo fim total desta guerra” para suspender as medidas restantes, alertando que isso envolveria “restringir as liberdades do povo britânico por muito tempo”.


Boris Johnson (Pippa Fowles/Flickr)

A partir de 1.º de abril, quando a população não terá mais acesso a testes gratuitos, as orientações serão alteradas novamente para sugerir que aqueles com sintomas de covid-19 tenham cautela para evitar a propagação do vírus.

Em uma entrevista coletiva, Johnson sugeriu que o Reino Unido poderia “aprender” com a Alemanha, onde as pessoas são “muito mais disciplinadas sobre não ir trabalhar” se estiverem doentes.

Os regulamentos gerais de lockdown também serão substituídos por orientações das autoridades locais para gerenciar surtos, como fariam com outras doenças. O primeiro-ministro se recusou a descartar a reintrodução de restrições diante de uma nova variante no futuro, alegando que é preciso “ser humilde diante da natureza”.

Ainda segundo Johnson, a partir de 24 de fevereiro, o governo “encerrará o rastreamento de contatos de rotina e não pedirá mais aos contatos próximos totalmente vacinados para testar diariamente por sete dias”. Todas as disposições temporárias da “Lei do Coronavírus”, que impõe restrições legais ao público, terminarão em 24 de março.

Testes gratuitos vão acabar

A população britânica não poderá mais acessar os testes de fluxo lateral e PCR  gratuitamente pelo National Health Service (NHS, o equivalente britânico do SUS brasileiro) a partir de 1.º de abril.

Espera-se que os testes estejam disponíveis para pessoas com mais de 80 anos e clinicamente vulneráveis, mas os grupos exatos que conseguirão solicitá-los devem ser decididos pela Agência de Segurança da Saúde do Reino Unido (UKHSA, na sigla em inglês) antes do prazo de 1.º de abril.


Autoteste disponibilizado pelo governo britânico (Annie Spratt/Unsplash)

Os pacientes assintomáticos em casas de repouso continuarão a receber testes gratuitos regularmente e a equipe também terá direito a eles, caso estejam sintomáticos. Os testes de diagnóstico gratuitos continuarão para os pacientes do NHS, com estoques disponíveis para testagens de “surto”, se necessário.

Johnson disse aos parlamentares que o orçamento de testes, rastreamento e isolamento teve um “grande custo”, excedendo todo o orçamento do Ministério do Interior em 2021, sendo £15,7 bilhões neste ano financeiro e £2 bilhões somente em janeiro, no auge da onda de infecções pela variante ômicron. “Agora devemos reduzir isso”, disse.

A expectativa é que os testes em massa nas escolas terminem em 1.º de abril. Além disso, funcionários e alunos na maioria dos ambientes escolares e creches não serão mais testados duas vezes por semana para covid-19.

A UKHSA também está trabalhando com empresas privadas para garantir que os testes de fluxo lateral estejam disponíveis em supermercados e farmácias quando não puderem mais ser solicitados gratuitamente no NHS.

Em uma tentativa de evitar o pânico e a compra em massa dos kits antes de 1.º de abril, o governo começou a racionar os testes de fluxo lateral para um pacote de sete testes a cada três dias, em vez de um a cada 24 horas.

Os testes em pessoas sintomáticas serão gratuitos para pacientes hospitalares, mas não haverá testes regulares assintomáticos nas enfermarias, a menos que haja um surto local. O governo também manterá um estoque de testes que podem ser implantados se uma nova variante ameaçar sobrecarregar o serviço de saúde.

Sistema de vigilância de novas variantes

A proteção contra vazamentos de laboratório será intensificada, acrescentou Johnson ao definir uma estratégia para a Grã-Bretanha contra outra possível futura pandemia.

O premiê disse que a Estratégia de Biossegurança do Reino Unido seria atualizada para proteger o país contra vazamentos naturais e liberações acidentais, bem como ameaças biológicas de outros países ou terroristas.

A pesquisa de infecção do Office for National Statistics (ONS) também permanecerá em vigor para monitorar o vírus, e os laboratórios manterão a capacidade de acelerar os testes para combater qualquer nova variante. Johnson, porém, deixou claro que a covid-19 agora seria gerenciada através de intervenções rotineiras de saúde pública e farmacêutica como a “primeira linha de defesa”.

A vacinação também continuará no futuro, com o Reino Unido garantindo o fornecimento de novas vacinas bivalentes — atualmente em testes —, que podem combater várias variantes com apenas uma dose.

A Grã-Bretanha sediará uma cúpula global de preparação para pandemias no final deste mês e deve assinar um tratado internacional concordando com a vigilância contínua.

Máscaras faciais serão opcionais

Após a abolição dos regulamentos de covid-19, as máscaras faciais não serão mais legalmente obrigatórias em nenhum lugar. Em vez disso, caberá a negócios e indivíduos decidir a abordagem que adotam, o que significa que empresas, teatros e lojas ainda podem solicitar que a proteção seja usada por funcionários e clientes.

Na segunda-feira, Sadiq Khan, prefeito de Londres, disse que as máscaras não seriam mais obrigatórias no metrô, embora as autoridades tenham o poder de impô-las como condição de transporte. “Após o governo abandonar todas as restrições legais da covid e à luz dos níveis de infecção em queda em Londres, espera-se que usar uma cobertura facial não seja mais uma condição de transporte”, disse.


(Ross Sneddon/Unsplash)

Os ministros ainda devem sugerir que as pessoas continuem a usar máscaras em espaços lotados e fechados, onde possam entrar em contato com pessoas que normalmente não conhecem, a fim de minimizar o risco de infecção.

Raghib Ali, pesquisador clínico sênior associado ao Conselho de Pesquisa Médica da Universidade de Cambridge, pediu que as pessoas vulneráveis ​​usem máscaras cirúrgicas de boa qualidade. “[Pessoas infectadas] não devem ir trabalhar, usar transporte público ou encontrar pessoas de alto risco”, disse em entrevista ao jornal Telegraph. “Enquanto as pessoas continuarem a seguir as orientações, não há razão para não suspender a exigência legal.”

Outras mudanças

O plano de Boris Johnson ainda inclui o oferecimento de uma dose de reforço da vacina contra a covid-19 para pessoas com menos de 50 anos e prevê a limitação de visitas hospitalares, passando a decisão para as entidades regionais e locais do NHS. Além disso, o país deixará de recomendar “passaportes da vacina” e as empresas locais foram aconselhadas a voltar a funcionar de forma presencial, para “recuperar a confiança” das pessoas.